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Caminhando com as Sombras

Hoje eu tenho plena consciência que vivi uma boa parte da minha vida sob o domínio de muitas das minhas sombras, ou "fantasminhas de estimação" como, carinhosamente gosto de lhes chamar...

Há uns meses atrás, numa das minhas preciosas caminhadas pela Natureza, a dada altura, olhando para o chão, reparei em algo que me chamou a atenção. Não era nada de novo, pelo contrário, situação bem comum e "banal" mas desta vez, por alguma razão, dei por mim a refletir sobre o que estava a observar.


Dei conta que, a cada passo que eu dava, fosse mais lento, ou mais rápido, eu nunca caminhava sozinha... havia "algo" que me acompanhava, que insistia em seguir as minhas pisadas. Bom, na verdade, durante uma boa parte do percurso parecia até o contrário - era eu que seguia as suas pisadas, uma vez que, de forma bem presente e ostensiva esse "algo" a que me refiro parecia andar à minha frente e "comandar" os meus passos e o ritmo do meu caminhar! Já divertida com a situação e com as reflexões metafóricas que ela estava a suscitar em mim, tentei ver-me livre dessa insistente "companhia", tentei despistá-la, ludibriá-la, "trocar-lhe as voltas" de alguma forma, mas foi em vão... nada conseguiu dissuadir essa "sombra gémea" que insistia em antecipar-se aos meus passos.


Pois bem! Esse algo a que me refiro era precisamente a minha sombra que ali estava à minha frente de uma forma tão "escancaradamente" nítida e com contornos bem definidos.


Ok! "Big deal!"... Então, e o que é que há de especial , relevante ou interessante nisso, que mereça uma reflexão? Bom, eventualmente, nada mesmo!... E está tudo certo, "amigos na mesma" Tudo sempre depende dos olhos de quem vê e do sentido que cada um encontra dentro de si.


O que a mim motivou esta reflexão que agora aqui partilho por palavras foi o facto de automaticamente aquela visão me ter levado a fazer uma analogia ou uma associação metafórica com o que se passa connosco em muitas alturas da nossa vida quando estamos a lidar com as nossas próprias "sombras" interiores. Por exemplo:

1. Da mesma forma que aquela sombra me tinha passado despercebida até ao momento em que, por alguma razão, eu "decidi" reparar nela e prestar-lhe atenção... quantas vezes na nossa vida não vivemos assim também numa espécie de "piloto automático" que não nos permite sequer reparar ou tomar consciência das "sombras" que estão a conduzir as nossas ações e a assumir o comando das nossas escolhas e decisões?... Na verdade é o que mais fazemos!...


"Fala por ti!"... poderão estar alguns de vocês a pensar!... Pois bem, parece-me justo! E assim o farei!... Hoje eu tenho plena consciência que vivi uma boa parte da minha vida sob o domínio de muitas das minhas sombras, ou "fantasminhas de estimação" como, carinhosamente gosto de lhes chamar, antes de mais, porque nem mesmo as reconhecia como tal; não as via!...


Aquilo a que aqui me refiro como "sombras" são todos os nossos medos, inseguranças, carências, apegos, dependências e co-dependências, lacunas ou bloqueios emocionais...; assim como todas as crenças limitantes que construímos a nosso respeito e que, na sua maioria são o resultado de tudo o que "herdamos" da família onde nascemos, da educação que recebemos, da sociedade onde vivemos, das nossas próprias experiências de vida e do modo como as interpretamos e como lidamos com elas...enfim!... de todos esses "arquivos" ou "bases de dados" que ficam armazenados no nosso "disco duro" e que passam a ser, efetivamente, uma espécie de programação mental (inconsciente) que nos faz funcionar no modo de "piloto automático"... ao ponto de realmente nos convencermos que todas essas "informações" são reais e que refletem exatamente quem nós somos!


Hoje eu sei que durante uma boa parte da minha vida vivi controlada por muitos medos e inseguranças, pela minha falta de autoestima, autoconfiança e amor-próprio, pela necessidade de ser aceite e valorizada pelos outros, pela apatia, pelo desânimo, pela tristeza, pela culpa, vergonha e pena de mim própria, pela rigidez e perfecionismo, pelo sentimento de não conseguir "encaixar" em lado nenhum, pela preguiça, pela necessidade de preencher o vazio emocional (que nem eu sabia que tinha) através de coisas externas e formas temporárias de felicidade, através de relações desequilibradas e abusivas, através de vícios (não, não cheguei à droga nem ao álcool!... Há muitas formas de vícios, incluindo o vício de ficar enredada em pensamentos e emoções negativas)... e, por aí vai... a lista seria extensa!!...


Durante muito tempo convenci-me que eu era assim e que não havia nada a fazer; na verdade nem questionava e nem pensava muito a respeito disso. Limitava-me a fazer o que a maior parte de nós faz quando está no "piloto automático"... simplesmente me deixava levar pela vida à espera de "dias melhores"!... Como não questionava nem olhava com "olhos de ver" para essa (falsa) identidade que tinha construído a meu respeito, e que, por isso mesmo, para mim era tão "real", naturalmente não estava capaz de reconhecer todas aquelas sombras como sombras! Exatamente como a sombra da minha caminhada que me passou despercebida até ao momento em que lhe dei atenção e a reconheci como uma sombra "atrelada" a mim!


Precisei de mergulhar no meu verdadeiro autoconhecimento para começar a ser capaz de fazer essa distinção e depois, então, aos poucos, ir sendo capaz de me ir despindo de todas essas camadas (sombras) que durante muito tempo tinham "conduzido os meus passos"! Só assim me pude ir aproximando mais e mais do meu "verdadeiro EU". E é assim mesmo o processo do autoconhecimento e do despertar interior - para saber quem EU SOU e me conhecer de verdade, "nua e crua", na minha essência, primeiro preciso de ver tudo o que não sou! É uma espécie de "descasque da cebola", camada a camada, até chegar ao núcleo!


Ver as sombras, reconhecê-las e aceitá-las é, então, o primeiro passo essencial quando queremos sair das "prisões" e das "muralhas" que construímos à nossa volta e que nos impedem de SER, viver e expressar o nosso verdadeiro e incrível potencial!!


E isto leva-me agora a um segundo aspeto a considerar na metáfora da caminhada:


2. Assim como aquela sombra, apesar de não ser "real", parecia conduzir os meus passos, caminhando à minha frente... quantas vezes na nossa vida não permitimos, na nossa inconsciência, que as nossas sombras nos "controlem", mesmo quando já estamos capazes de as ver?


Ou seja, se a capacidade de reconhecermos e aceitarmos as nossas sombras já é uma grande conquista, por si só não é necessariamente suficiente para que elas deixem de nos controlar porque, afinal de contas foi uma "vida inteira" a viver no "piloto automático", e a nossa mente funciona pelo hábito e repetição. Precisamos, então, de ir desenvolvendo a nossa capacidade de passarmos a viver num estado consciente e desperto, porque só assim podemos sair do automático e começar a assumir o controlo sobre as nossas próprias emoções e comportamentos.


E finalmente, um terceiro aspeto que quero referir é o seguinte:


3. Da mesma forma como eu tentei, já em jeito de brincadeira, ludibriar aquela sombra que me acompanhava para ver se ela ia embora, até perceber que não tinha como a fazer desaparecer e, como tal, mais valia aceitar a sua presença e companhia... quantas vezes na nossa vida não fazemos o mesmo com as nossas "sombras" interiores?


Este, eu diria, é talvez um dos aspetos mais importantes e mais desafiantes quando começamos a reconhecer a existência das nossas sombras e o quanto elas estão a limitar e a boicotar a nossa vida e a nossa felicidade!...


Para mim, nem sempre foi um processo fácil e agradável porque me tirou da minha zona de conforto e me obrigou a "olhar-me ao espelho" como nunca tinha feito antes... e, então, como qualquer outro ser humano que se preze, tantas e tantas vezes tentei "fugir" e resistir à mudança. E foi nessas tentativas de fuga ou resistência que, muitas vezes, tentei "ludibriar" as minhas sombras, fingindo que elas não estavam lá, encontrando manobras de distração para não ter que as ver e enfrentar, caindo na ingénua ilusão de acreditar que um dia "magicamente" elas iriam desaparecer ou viria alguém especial para "me salvar"., sem que eu tivesse que "meter a mão na massa"!...


Até que finalmente a "ficha foi caindo" e fui percebendo que quanto mais eu insistia em querer fugir das minhas sombras ou afastá-las de mim, mais estava a alimentá-las. É como varrer o lixo para debaixo do tapete. Por uns tempos pode dar a ilusão de que está tudo limpinho, mas quando vier um vento mais forte que faça voar o tapete, toda aquela poeira e sujidade ali tão bem escondidinhas, vão vir novamente à superfície e não vai dar mais para as ignorar.


A minha verdadeira "cura" começou quando finalmente percebi e aceitei que tentar fugir ou negar as minhas sombras (ou "fantasminhas de estimação") era, no fundo, como se estivesse a fugir ou a rejeitar partes de mim mesma e, em vez disso, passei a aceitá-las, a acolhê-las, a amá-las e a permitir que "caminhassem comigo"!...


E tu, conheces bem as tuas sombras?...

Como as tens acolhido?...


“Ver as sombras, reconhecê-las e aceitá-las é, então, o primeiro passo essencial quando queremos sair das "prisões" e das "muralhas" que construímos à nossa volta e que nos impedem de SER, viver e expressar o nosso verdadeiro e incrível potencial!!"

Até já!!...

Sofia Silva





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